quinta-feira, 1 de abril de 2010

Atos recuperam atos.

- Marcela não é pra você.
- Por que diz isso, Flávio?
- Eu a amo.
- Eu sei. A ama a mais tempo que eu.
- A mereço.
- Eu também.
- Por nossa amizade.
- Não me peça algo assim. Gosto dela, você sabe.
- Você ta doente, Guilherme. Ela precisa de alguém forte ao seu lado.
- Não jogue isso na minha cara. Não tem caráter?
- O mesmo que o seu. Sabe que tenho. Não falei por mal, Guile. Só quero vê-la feliz.
- Não poderei dar-lhe felicidade eterna.
- Na verdade, ninguém pode. Mas poderei dar por mais tempo.
- Não vou morrer, Flávio!
- Não. Não vai. Vai se tratar e se curar, se Deus quiser.
- Se acredita nisso, por que o conteúdo dessa conversa?
- Só quero ficar com ela.
- Ela esta comigo.
- Perdoe-me por tudo. Não voltarei a te incomodar. Vou embora.
- Como assim?
- Vou morar fora do Brasil.
- Por que isso?
- Quer mesmo ouvir?
- Já imagino.
- A faça feliz. E seja feliz você também, Guilherme.

Os amigos se abraçam e Flávio se vai.
Guilherme estava confuso. Será que Flávio tinha razão? Seria hora de contar a Marcela de seu estado de saúde?

(...)

Marcela se revirava na cama. Não parava de chorar. Há quase seis meses tinha recebido a noticia de que Guilherme tinha ido embora. Sem lhe dar nenhuma explicação, uma ligação, um e-mail, nem um recado por um dos amigos. Apenas havia ido.

Marcela e Guilherme namoraram por dois anos e meio e logo ficaram noivos. Se amavam e tinham em suas mentes seu casamento. Estava próximo, o mais tardar, o ano que viria.

Tudo estava bem na visão de Marcela, mas na de Guilherme, as coisas precisavam tomar um novo rumo. Sua conversa com Flávio o fez enxergar que precisava deixar Marcela livre. Livre para amar de novo e quem sabe, amar Flávio.

- Por que ele foi embora, Flávio?
- Eu não sei, Marcela.
- Sabe sim, não minta pra mim! Você é o melhor amigo dele! Sabe de alguma coisa! Me conte! Pra onde ele foi?
- Suíça.
- O que?
- Isso que ouviu.
- Por que?
- Não sei.
- Por que, Flávio

Marcela estava alterada.

- Depois que conversei com ele, ele me ligou e só me disse que ia embora.
- O que você conversou com ele?
- Disse que te amava.
- O que?
- Isso que já sabe.
- Por que?
- Eu te amo, Marcela. Não queria mais te ver com ele.
- Ele foi embora, seu desgraçado! Sem nem me dizer nada! Tem noção do que fez, Flávio?
- Sinto muito, Marcela. Não queria isso. Só desabafei com ele, como você mesmo disse, ele é meu melhor amigo. Não estava mais agüentando esconder isso dele.
- Isso nunca foi uma surpresa pra ninguém.
- Eu disse a ele que ia embora.
- Você?
- Sim, eu ia embora. Mas ele foi mais rápido.

(...)

- Alô.
- Marcela?
- Sim, quem fala?
- Sou eu, Júlia.
- O que quer?
- Não me trata assim, Cela... tenta me entender.
- Me ligou pra que, Júlia?
- Queria saber como estava...
- Muito bem, obrigada. Era só isso?
- Não faz assim, Marcela.
- Era só isso?
- A Andréa quer falar com você.
- Não se incomode.
- Cela?
- Diga...
- Por que ta tratando a gente assim? Entende a gente...
- E VOCES ME ENTENDAM! HÁ QUASE SEIS MESES O GUILHERME ME ABANDONOU, SEM DIZER NADA! SURPRESA! EU O AMO, VOCES SABIAM? E COMO SE NÃO BASTASSE DESCUBRO QUE ELE FOI EMBORA POR CAUSA DO FLÁVIO, MEU MELHOR AMIGO! SABIAM DISSO TAMBÉM? CLARO QUE SABIAM EU CONTEI PRA VOCES. MAS ACHO QUE ESTAVAM MUITO PREOCUPADAS COM ESSA MALDITA VIAGEM DE VOCES PRA SE PREOCUPAR COM QUALQUER COISA QUE DISSESSE RESPEITO A MIM!
- Marcela...
- E DEPOIS DISSO TUDO, VOCES DUAS, MINHAS MELHORES E UNICAS AMIGAS DECIDEM IR EMBORA! ESTOU SOZINHA, MENINAS! SOZINHA! OBRIGADO POR SE PREOCUPAREM TANTO COMIGO, VOU VIVER MUITO BEM DO JEITO QUE ESTOU. SEM O GUILHERME, SEM EMPREGO E SEM AMIGOS!

Marcela desliga o telefone transtornada. Corre pra varanda, olha fixamente pra baixo. Estava nervosa, queria morrer, queria se encontrar novamente na verdade, mas não conseguia, então seu único e palpável desejo era a morte.

(...)

A campainha tocava insistentemente. Marcela não queria atender, não esperava ninguém, não podia ser ninguém que a interessasse. A única pessoa que poderia lhe interessar no momento era Paulo e ele estava no trabalho, provavelmente. O som da campainha a estava transtornando mais. Correu ate a porta e a abriu, sem ver quem era pelo olho mágico.

- O que faz aqui?
- Precisamos conversar, Marcela.
- Não temos mais nada pra conversar. Já lhe disse tudo que queria da ultima vez.
- Mas eu não consigo mais ficar desse jeito. Somos amigos. Não podemos ficar assim um com o outro.
- Lembrou que era meu amigo quando? Quando falou o que falou ao Guilherme que não foi.
- Me perdoa. Já te disse. Precisava desabafar com alguém, ele foi a minha única saída.
- Paulinho não podia ne? Tinha que ser logo o Guile...
- Tinha que ser com ele.
- Claro, pra fuder a minha vida, tinha que ser com ele mesmo.
- Nunca quis fuder a sua vida, Marcela! Posso entrar?
- Não.
- Vamos conversar como dois adultos que somos, ok?
- Você me faz rir, Flávio.

Flávio entra no apartamento de Marcela e logo se senta no sofá.

- Senta aqui do meu lado.
- Estou bem de pé.
- Como queira... quero que sejamos amigos como sempre fomos. Há anos, desde adolescentes.
- Sua amizade não me interessa mais.
- Não sabe mentir. Não tente.
- Pode me interessar ainda, mas uma hora não mais.
- Por isso estou aqui, não quero que essa hora chegue.
- É a hora que eu mais quero que chegue.

Flávio respira fundo.

- Te amo, mas sua amizade sempre foi mais importante pra mim.
- Por que não pensou nisso antes?
- Estava mal, Marcela.
- E eu estou pior agora.
- Quero te ajudar. Estou disposto a te ajudar a descobrir a verdade.
- Do que esta falando?
- Sei por que exatamente Guilherme foi embora.
- Por que você encheu a cabeça dele de besteiras.
- Não, Marcela. Há um motivo muito mais forte.
- E qual é?
- Vou te ajudar a descobrir, mas não serei eu quem vai te contar. Não tenho esse direito.
- E quem vai me contar?
- Esta disposta a ir ate a Suíça?
- Co-como?
- Isso que ouviu. Sei onde ele esta. E posso leva-la ate ele.
- Não, não quero.
- Sabe que quer. Mas tem medo.
- Ele me largou aqui, sem nem pensar nos meus sentimentos. Não quero mais nada com o Guilherme.
- Não é isso que seu coração diz.
- Mas é o que a razão diz. Guilherme pra mim morreu.
- E por que ate hoje chora tanto por ele?
- Costumo chorar muito pelos mortos.
- Vai se arrepender do que esta dizendo, Marcela. Vamos para a Suíça.
- Já falei que não vou. E você não pode me obrigar.
- Não tem mesmo curiosidade em saber o que levou ele a te abandonar? Não acredita no amor que ele dizia sentir por você?
- Isso não vem ao caso. Não tem nada haver.
- Tem sim! Tem tudo haver! Se acreditar no amor que ele dizia sentir por você, não pode crer que ele te abandonaria assim, do nada. Algo forte o fez fazer isso. E você só descobrirá se me acompanhar.

Marcela chorava. Flávio a abraçou.

- Não queria ter te magoado como magoei. Sei que errei e peço perdão, de verdade. E agora quero recompensar meu erro, te levando ate ele.
- Vou pensar, Flávio.
- Não pense, o vôo sai daqui a duas horas.

continua...

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